Todos os dias deitámo-nos um pouco mais retalhados.
A prova que corre mal, o ordenado que não chega para cobrir as dívidas. As
finanças que nos consentem 24horas de despejo da nossa própria casa. Uma
discussão agreste com a família e somos projectados no atoleiro em que se
transformou a vida. No emprego somos enxovalhados pelo chefe. Na chegada ao
muquifo onde agora se vive, é-se imediatamente apedrejada pelo cônjuge, que se
desapaixonou. Larga-se o emprego, saísse do domicílio. Pede-se o divórcio.
Lança-se à má sorte. Odeio-te! Amo-te! Amaldiçoou-te! Perdoou-te! Mato-te!
Ambiciono-te. Eu, tu, eles, nós, vós. Aqui, agora, já, depois. O décimo
primeiro andar do edifício abandonado, nos recessos à
baixa espera por mim. De lá observo o rosto da cidade e os espíritos ruins das
criaturas. Também já fizemos parte dessa gentalha. Neste momento eu não sou eu.
Sou o monstro que elas criaram. Meramente quando paro para pensar sobre vocês. Eu
sei... Que páras para pensar sobre mim. Conheces bem a monstruosidade que
alimentaste. Cada sentimento que tenho… está
cada vez mais perto da tua extinção. Mas sabes que infelizmente, ainda te amo.
E tu ainda sentes a minha falta. Sobre o véu da lua eu aguardo pacientemente o
dia da caça.
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