Desespero. Angustia. Medo. Aflição. Fizera amor pela
primeira vez. Com um desconhecido e… sem protecção. Mas onde raio tinha a
cabeça! Brownie olhou para mim do meio da porta e aproximou-se.
- O que se passa Brownie? Tens alguma coisa para
acrescentar ao maior erro da minha vida?
A cadela fungou e deitou a cabeça na minha perna.
Ela não me censurava. Estaria ali para mim. Pró o que desse e viesse.
Afaguei-lhe o pêlo e acostei-me no sofá. Com um pouco de sorte não haveriam
repercussões maiores e aquele erro seria passado. Não sabia nada dele. O que
fazia? Sobrenome? Morada? Vida? A única coisa que sabia era o seu nome. E se
era verdeiro ou não, o que importava agora?
Segunda-feira de manhã. Taca o telefone. Saltei do sofá, assustada. Que
porra! É apenas o telefone.
- É a Sra. Lynnne? – Perguntou uma voz
feminina do outro lado da linha.
- Sim. A própria.
- Fala do banco Barclays. Entrou na sua conta um
cheque sem cobertura. Teremos de comunicar o ocorrido à central. Caso não
regularize o montante em divida.
- De quanto é a quantia mesmo? – Perguntei
fazendo-me de parva.
- De 450 euros minha senhora.
- Eu ainda não recebi. Não tenho como regularizar a
situação antes do final do mês.
- Então teremos de denunciar o ocorrido.
Pib pib pib pib. Maldito sonido telefónico. Claro que já esperava por este desfecho. No mês
anterior deixara a janela da cozinha entreaberta e o Necas fugira. Comera de
certeza, os restos de lixo doméstico nalgum contentor ali perto. Horas depois,
apareceu-me à porta do prédio num estado lastimoso. Corri para a clinica
veterinária mais próxima. Ao chegar perguntaram-me se podia ter sido
envenenado. Envenenado? Não. Mas tudo indicava que sim. Muita sorte. Ainda tive
em aceitarem um cheque como forma de pagamento e ainda assim cuidarem dele tão
bem. Como quando os donos mais desafogados pagam logo com dinheiro à vista.
Final da
semana. Nunca mais chegava. Lá em cima - disse apontando as mãos para o alto.
Devem ter determinado que esta a semana seria a ideal para envernizarem-me
vida. De todos os telefonemas que recebia, cinco deles tinham de ser trágicos e
injuriosos.
Fui ao multibanco. O meu ordenado já caíra na conta.
Mas nem vê-lo. O banco usara-o na regularização do cheque careca. Estou bonita.
Como vou pagar a água, luz e gás com 100euros e ainda comer o mês inteiro? Para
não falar do Necas e da Brownie.
Recordei-me que na vinda para cá. Pois há dias que
não tinha dinheiro nem para papel higiénico, quanto mais para gasolina. Que o
café duas ruas mais abaixo da minha casa, procurava um empregada de balcão.
Fui
aceite. O dono do café já me conhecia. Via-me passar uma data de vez por ali.
Ainda que não fosse uma das suas clientes habituais. Quando podia era lá que ia
sempre. Desconfio também que a minha aparência ajudava-o no negócio. Conjecturas
plausíveis.
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